Tema 192 - MEU TESOURO!
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MEU MAIOR TESOURO
Bóris Yan

Hoje resolvi "quebrar o protocolo" e escrever uma história real. O tema proposto e as datas exigidas me soaram extremamente familiares, que mesmo imaginando que isso contraria o foco do site decidi escrever um trecho da minha própria história.

...no dia em que fiz 18 anos (05/03/1953) mamãe e suas auxiliares me prepararam um dia com doces, bolos e pratos preferidos, com boa parte da família reunida em nossa casa (Ipanema, RJ). Depois do almoço tio Bernard e papai me chamaram para uma conversa secreta na biblioteca.

- Hoje tens 18 anos (com o charuto na boca) já conheceu uma mulher? Já experimentou dormir com uma mulher? Disse malicioso.

- Não tio. Respondi corado.

- Pois hoje daremos um jeito nisso, um homem feito precisa da companhia de uma mulher. Pontuou papai.

Ambos gargalharam menos eu, todo envergonhado.

- Vamos os três ao bordel. Concluiu Tio Bernard

Não vou negar que pelo resto da tarde e inicio da noite eu fiquei dividido entre ansiedade e medo, curiosidade e vergonha. Enfim, depois do jantar, fim da festa que durou um dia todo, alguns parentes foram descansar e outros foram para suas casas.

Papai, tio Bernard e eu saímos discretamente e fomos ao bordel. Fomos ao salão de Madame Hélène (diga com sotaque francês) em Niterói. O salão era uma versão melhorada da Casa de Eny, no local também encontrávamos políticos, artistas e intelectuais a procura de diversão e prazer (não vou mencionar nomes).

Papai já havia "encomendado" a Madame Hélène uma jovem virgem. Uma virgem só para mim, um rapaz virgem de 18 anos...

Enquanto aguardávamos "meu presente" de aniversário, tomei dois goles da mesma bebida amarga que papai tomava e traguei uma ou duas vezes um charuto oferecido por meu tio. Penso que aquilo era uma espécie de rito de passagem para eles... O tio dizia era preciso ter carinho com as moças, as mãos deveriam ser suaves e as palavras doces, etc, etc. Papai dizia que era necessário mostrar quem mandava, quem ditava o ritmo, tanto as putas quanto as moças de família apreciavam homens fortes e enérgicos na cama... As putas deveriam fazer o que eu ordenasse sem reservas, etc, etc... Hélène chegou trazendo Scarlet consigo (nunca esqueci essa visão) uma moça de 15 anos, esguia, linda, morena, cabelos cacheados e longos, olhos castanhos tímidos, virgem, uma roupa bem transparente e branca, trêmula, dedos nervosos se enroscando nas mãos, respiração ofegante, o som do piano ao fundo, a luz, o cheiro, as pernas torneadas, os dedinhos, o barulho das vozes, a cor, os lábios...

Papai e titio salivavam diante do meu "presente"...

Depois das devidas apresentações eu as acompanhei ao nível superior do salão, subimos dois lances de escadas em silêncio. Paramos em frente a um quarto que tinha palavra doçura escrita na porta. A Madame nos fez entrar, ela me fez recomendações que não me lembro (honestamente não me lembro mesmo). Ficamos 30 minutos ou mais de pé em profundo silencio, Scarlet ainda respirava ofegante e enroscava os dedos das mãos... Eu não sabia como começar, apesar de lembrar dos conselhos de meu pai e tio, das conversas com os amigos... Ficamos parados sentindo algo novo e envolvente que não consigo verbalizar até hoje... O cheiro dela me deixava excitado, aquela pele morena e virgem me deixava tão excitado que sentia doer o membro... Eu podia ouvir as batidas daquele coração, ela olhava para o chão todo o tempo... Peguei sua mão e a conduzi para a cama ( em silencio) e ela obedeceu-me. O contato com sua mão fria me dava a sensação de ondas quentes de prazer, foi incrível!

-Qual é teu nome. Perguntei com a voz rouca.

- Lenic...(fez uma pausa longa) Scarlet. Disse envergonhada.

O som daquela voz doce, suave, delicada... Quase, quase gozei sentado na cama (outra coisa que jamais esqueci foi a força erótica daquela situação).

...Começamos a conversar de repente, falamos de vários assuntos... Destravamos e começamos a conversar... Vez por outra eu lembrava que o objetivo era o sexo e não a conversa, mas estava tão bom! Ela passou a olhar-me nos olhos, ela passou a sorrir... Pensava no sexo, mas aquela sensação de encontro era poderosa...

Alguém bateu na porta e gritou: 8 horas, fim da festa.

- Volta? Disse ela agarrando minha mão

- Volto. Respondi com toda a convicção do mundo.

... Papai, tio Bernard e a Madame me aguardavam no salão principal. Antes que dissessem ou me perguntassem algo fui logo dizendo:

- Eu a quero novamente hoje, só pra mim.

... Depois de vários comentários, acertamos que sim... Papai estava orgulhoso...

...Na segunda noite, conversamos e sorrimos muito... Na terceira noite brincamos e nos beijamos muito...

Ela me contou que o nome Scarlet foi inventado pela Madame, Lenice era o nome da capixaba por quem eu já estava loucamente apaixonado...

... Na quinta noite fizemos amor... Foi perfeito, foi consentido, foi desejado, foi apaixonado, foi verdadeiro... Na sexta noite fizemos amor como se já fossemos amantes de décadas...

Mamãe quis saber aonde eu ia todas as noites... Enquanto houve álibis papai os usou, depois nem sei o que ele inventou... Exigi total exclusividade com Scarlet e é calro que a Madame concordou e é claro que papai ficou furioso com a fortuna que isso custou.

Lenice sentia pavor de se deitar com outros homens como faziam as outras "meninas". Nós nos amávamos muito... Foram meses de amor no bordel...

(Vou tentar resumir ao máximo, corro contra o tempo agora)

...Fui estudar em São Paulo e Lenice foi comigo, depois que o Tio Bernard viabilizou um bom e vantajoso acordo com Madame Hélène... Ele também providenciou uma casinha discreta para Lenice e eu vivermos nosso sonho... Estudava medicina (sou um medico aposentado) e nossa vida foi perfeita e completa até o dia em que mamãe cismou em me casar com uma burguesinha carioca... Neguei totalmente essa possibilidade... Toda verdade veio à tona...

Mamãe fez um escândalo que eu não imaginei que ela fosse capaz de fazer...

- onde se viu, um futuro médico casado com uma meretriz! O que dirão as boas famílias? Quem lhe recomendará! Teorizava a senhora.

... A família toda se envolveu...

Papai se virou contra mim, ele queria que fosse apenas uma aventura que me fizesse companhia enquanto eu estudasse fora. Depois eu voltaria médico e me casaria com uma dama, quem sabe até poderia manter a outra como diversão...

...Foi um momento muito difícil para nós todos... Rompi com minha família. Deixei de receber as generosas mesadas. Passamos muitas dificuldades financeiras. Comecei a trabalhar e Lenice começou a trabalhar também, mas ainda assim passamos grandes privações, lembro-me de uma noite em que não havia nada em casa.

- Será melhor que eu volte para casa de meus pais e você volte para a casa de Madame Hélène, depois que eu me estabilizar e vou e te busco de volta. Falei num momento de desespero.

Nunca esqueci o tom do choro decepcionado de Lenice.

Na verdade, aquela jovem frágil me ensinou a lutar, a ter objetivos... Nos completávamos na cama e fora dela, nos entendíamos, nos sentíamos.

...fizemos amigos em São Paulo. Nos casamos em 06/07/1958. Terminei os estudos e me formei com louvor. Lenice estudou sociologia anos depois. Tivemos cinco filhos lindos. Trabalhei muito, ou melhor, trabalhamos muito. Nos amamos muito. Em público eu a chamava carinhosamente de doçura e em particular eu a chamava de Scarlet (foi assim a vida toda) No começo foi muito complicado, mas depois a vida nos foi muito generosa... Minha família nos aceitou muito tempo depois, por intermédio e negociação do meu saudoso tio Bernard...

Fomos felizes.

Mas o destino reservou-me um fim de vida triste.

Lenice minha doçura, morreu em 29/06/2008 vítima de câncer de mama. (Isso é extremamente difícil para mim). É minha maior desgraça. (Quando vi a coincidência das datas resolvi escrever).

...Deixei meus negócios com os filhos e me mudei para o Espírito Santo (terra natal dela) Se esse texto for mesmo publicado vou ler de longe, parto hoje, (daqui a algumas horas) para refazer sozinho uma de nossas viagens inesquecíveis. Vou me hospedar novamente no Sofitel Amsterdam the Grand (Hotel preferido dela) e visitar a provícia de Utrecht (roteiro preferido dela)...

Consegui tudo que um homem pode desejar. Venci preconceitos e vivi um grande amor, mas, já vai fazer um ano que perdi meu maior tesouro ...

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