Tema 024 - A PERFEITA SOLIDÃO
BIOGRAFIA
VERDE GOSMA
Fernando Zocca

Fui casado pela primeira vez com Maria Helena. Tivemos uma única filha. Hoje ela tem 16 anos. No meu segundo casamento, dispensei os papéis. Disse para a viúva com quem me juntei que papel não seria tão necessário quanto o carinho que se deve dar um ao outro.

Sabe, sempre fui um sujeito assim meio sorumbático. Gosto de tomar minha cerveja em lata. Ficar ouvindo música sertaneja na borda de minha piscina e ouvir minha cadela latir. Parece estranho? Pois minha totó tem um timbre todo especial. Adoro ouvi-la.

Com essa minha segunda junção tive também outra filha. Já está uma moça bonita. Achei bastante esquisito e estranho ter encontrado junto de suas roupas uma camisinha. Eu lhe perguntei se era dela. Disse-me que não, que poderia ter sido da empregada. A empregada, se ainda não lhes contei é a irmã de minha mulher. Muito boa trabalhadora.

Mas sabe, tenho cá comigo muita tristeza. É pelo fato de essa minha cunhada ser dada a bater um tambor de quando em vez. Ela freqüenta uns terreiros por aí. Eu não gosto muito disso apesar de respeitar suas vontades.

Como sou conhecedor de técnicas de vendas, eis que fui gerente de uma cadeia de lojas lá na minha cidade, sei muito bem como provocar a repulsa das pessoas de quem realmente não gosto.

Faço o maior auê na redondeza quando quero que uma coisa aconteça. Uma verdadeira campanha publicitária. Você me entende?

Bem eu estava mal de vida. Depois que me separei fiquei assim jururu. Meio cabisbaixo. Sabe assim borocoxô? Então...

Mas depois que me apareceu esta mulher, a segundona, tudo melhorou. Ela é comerciante poderosa. Tem muito crédito na praça. Movimenta milhões de reais. Até meus carros velhos tenho trocado todos eles. Agora comprei um novinho em folha. Nem placas ainda tem. É verde. Verde musgo. Musgo piscina destratada. Verde gosma. Nenéia (é assim que eu chamo carinhosamente minha segundona), foi enfática em negar a cor. Queria preta ou branca. Ela é Corintiana. Eu não tinha muita calma na escolha. Queria levar logo um carrão zero. E naquele momento só havia esse verdolengo aí. Bem, aí está. Dizem que sou meio solitário. Mas não. Não se vive sozinho neste mundo. De forma alguma. A solidão é muito difícil. Pode levar à loucura. Aliás, diziam que eu era louco. Que sou louco. Mas pô, não rasgo dinheiro, não me alimento com dejetos e ainda trabalho... Por quê eles dizem isso de mim? É implicância. Só pode ser isso. Bem vou indo. Até mais, que eu vou em frente. E olho vivo, que cavalo não desce escada...

Protegido de acordo com a Lei dos Direitos Autorais - Não reproduza o texto acima sem a expressa autorização do autor